Pena de Degredo

A felicidade desapareceu por completo
Esvaiu-se sem deixar rastros
Criou asas e voou, depois sumiu,
Agora a noite estupra os pensamentos
Com culposas desculpas crepusculinas
Oferecendo a poster falsos sonhos
Realidades momentâneas de mentira,
Aquele artifício canalha do sono
Como forma de ministrar anestesia;

Podem ser ouvidos os gemidos neurais
Após a última gota escorrer dos escombros
De um rosto que já não mais sorri
Semelhante à Pietà de Michelangelo
Os lamentos trancafiados no peito
Enquanto os outros simplesmente dão de ombros,
Rangendo os dentes como forma de protesto,
Sobrevivendo à base de irrelevantes escambos,

Por fora alertas, por dentro mortos,
É assim que zanzam os fantasmas,
Como doces figuras sãs de rosto,
Porém, deveras doentes de espírito;
Um rascunho de papiro rasurado
Protegido pela couraça da capa
Artifício para disfarçar a fragilidade
Do continente que o criptex resguarda;

Zera-se o relógio, que por hora,
Na ausência de seus ponteiros
Se desponta aleijado, incompleto
Como telhado nu e sem guieiro
Parece bobagem, bem que sei
O teor deste ambiente abjeto;
Delírios em boa hora eu creio
Relógios analógicos me fascinam
É como se fossem para mim amuletos
Que o tempo como tudo que toca
Leva embora, dando fim ao recreio,
A felicidade criou asas e voou,
A vida tornou-se uma pena de degredo.

por Júnio Liberato

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