Este mês de agosto mostrou a que veio, destemido e sagaz como bem se revelam a passagem dos meses, trouxe consigo o frio que os seus parceiros anteriores não revelaram logo de cara. Já bem de manhãzinha uma névoa espessa desce dos céus cobrindo com autoridade o jardim, o pomar e a grama fina do terreiro, e a brisa matinal que parece soprada de lábios sobrenaturais, assobia um silvo agudo, e à noite tudo é ainda mais intenso, sinto como se estivesse envolto por pequenos cubos de gelo. Nada estranho até então, pois estou muito bem acostumado com palavras gélidas e tratamentos de gelo, nada tão angustiante como saber de cor a sensação de ser ignorado, geradora de uma pontiaguda e desconfortável pontada bem no meio do peito, típica daqueles quando se decepcionam com alguém e se desesperam logo em seguida. Presente! Quem é sincero sempre sofre mais, no entanto, quem sofre nem sempre aprende atribuir a devida atenção aos ensinamentos dolorosos, e se fecham, ao invés de se abrirem para novas perspectivas de vida. Isso talvez explique meu repúdio para com o inverno, ademais, nenhum inverno me espanta tanto quanto a frieza humana, e por tal razão, confesso não ser muito fã dos seres humanos. Em consequência do frio, é que fui incapaz de olhar através do vidro transparente da janela ao amanhecer, talvez, eu não quisesse me deparar deveras cedo com a neblina úmida que pairava sobre a atmosfera exterior do meu quarto, ambiente também lusco-fusco, onde um nevoeiro ainda mais denso pairava sobre meus olhos, nuvem de lágrimas que afogaram minhas rasas esperanças ainda existentes no fundo compadecido de um olhar, e o amor nestes casos reservados, revela-se uma âncora pesada demais, que além de manter o navio estático, o faz naufragar; eu sou o navio, e a âncora perversa é este amor refutado que meu coração não superou.
Perco-me, e o faço de bom grado, já que a luz da lua que me guia pela noite misteriosa fez o grande favor de não dar as caras, e justamente hoje, o dia em que mais careço banhar-me em sua luz revigorantemente pálida sobre meu olhar úmido que padece em tristeza por uma luz ainda mais cristalina que não brilhou em meu céu, no cerne de minh’alma e nas profundezas trevosas de meu coração, ah, pobre de mim. Qual será a minha sina após superar esta decepção? Bom, reclamar não é papel para homem da minha idade, porém, quem se mantém sóbrio e ainda fiel aos costumes corriqueiros quando está à beira de ser nocauteado pelas artimanhas do coração? Talvez seja preciso amar mais, mais com a consciência do que com o coração, já que este, sob efeito das paixões passageiras, não se dá conta de se apegar ao essencial, ao invés disso, sente o que quer, despido de rédeas, tendo cortados os cabos dos freios e atado a uma paixão que o torna escravo, um coração maltratado jamais volta ao seu formato virginal, destituído de amores desvairados. O amor também faz seus escravos.
Deixo-me então à deriva, boiando solitário sobre a poça de lágrimas que verti, salgadas e frias bem como um mar esquecido e inexplorado, perdido por aí em algum canto do mundo. Minha vida é uma nau sem rumo, e meu orgulho jaz na escuridão, já que não sou capaz de enxergar a luz fascinante que me cerca emanada das belas obras da natureza, deveria me apaixonar por tais maravilhas; a flor, a borboleta, o reflexo do sol radiante que resplandece na nuvem branca, tão branca como algodão doce, confeccionado por Deus, confeiteiro invisível que adoça o paladar que jaz no amargor das mazelas do viver. De volta ao mundo real, encontro-me anestesiado. Sinto-me assim, como um barco que perdeu sua vela, ou caravela que teve seu casco rasgado, e bem se sabe que um coração destroçado é semelhante a uma carta rasgada antes mesmo de ser lida. A resposta é dada, mas o recado não é entregue. Quantas vidas são necessárias para se compreender o amor? Eu bem gostaria de saber qual o antídoto contra tais males; sim, males, porque paixões são como minas terrestres escondidas por sob um par de olhos e um tenro sorriso num campo inimigo que se desponta num momento de fragilidade, de todos o mais inoportuno para defesas, e se forem feitas tentativas, serão em vão. O mal do apaixonado é não se apaixonar pelo que vê antes de o fazer pelo que está oculto.
Parece que perdi mais uma batalha, porém, a guerrilha ainda não terminou, só termina quando o último soldado é abatido, e a esperança é uma recruta esperta e contumaz. Verdade seja dita, meu troféu não reluziu como é de costume se ver nas taças ao final de grandes e importantes campeonatos, todavia, ainda assim admiro esse troféu e me orgulho de mim mesmo por ter o conquistado, pois apesar de não brilhar e refletir a luz do sol como eu bem desejei, ainda assim se trata de uma conquista que por mérito próprio fui capaz de adquirir. Este troféu meus queridos, nada mais é do que a maturidade, joia rara e lapidada que apenas o tempo é capaz de trazer e entregar de forma honrosa e triunfal, nada neste mundo é mais útil para alguém do que sua maturidade aguçada, uma mente experiente sabe se defender melhor das armadilhas que o coração, vizinho cego e emocional dos pulmões, se deixa capturar facilmente, pois a impaciência é a chave do desastre. Este mês de agosto está mais frio que o normal.
Uma resposta
Muito b9m.seu texto.